O Dialeto é um grupo paulistano que já acumula décadas de trajetória. Formado pelo virtuoso guitarrista Nelson Coelho, a banda hoje é um trio composto por outros dois renomados músicos paulistas – Gabriel Costa (baixo) e Fred Barley (bateria). O trio forma um dos mais importantes agrupamentos brasileiros e tem um conjunto de lançamentos consistentes de 2008 em diante.

Em 2017, Nelson Coelho teve a ousada iniciativa de fazer um álbum inteiro reinterpretando obras do compositor húngaro Béla Bartók (1881 – 1945). A relação de Coelho com a obra de Bartók vem desde a década de 1980, com o primeiro contato tendo ocorrido através do filme “O Iluminado”, de Stanley Kubrick, no qual foram usados alguns trechos de uma das peças de Bartók. Posteriormente, em uma das edições do tradicional festival de inverno de Campos de Jordão, a exibição de Roumanian Folk Dances foi causa de grande emoção para o músico, que ficou completamente rendido pela força da música de Bartók ao longo de toda a sua trajetória. A idéia de reler Bartók já existia desde os primórdios do Dialeto, tendo sido executada ao vivo em algumas ocasiões no início dos anos 90. Contudo, a concretização em um álbum veio só anos depois. O disco foi um acerto em todos os sentidos, já que a inventividade das interpretações e o vigor que a banda imprimiu em sua execução foi capaz de atualizar e manter fresca a obra de Bartók para os ouvidos atuais.

Coelho sempre associou a musicalidade da peça para Quarteto de Cordas nº 4 de Bartók (1928) com as composições do álbum Larks Tongues in Aspic, do King Crimson, banda da qual o guitarrista já era fã desde meados dos anos 70. Boa parte dessa relação devia-se a presença do violino de David Cross. Na ocasião do lançamento do álbum The Last Tribe (2013), Coelho resgatou o assunto com o manager do selo Moonjune Records, que conhecia David Cross e sabia que o violinista era uma pessoa bastante aberta e disponível. Então, ambos foram colocados em contato e uma parceria foi concretizada para a gravação de uma das faixas de Bartók in Rock (2017).

Durante os shows de promoção do álbum no ano seguinte, a oportunidade de trazer David Cross ao Brasil apareceu e dois shows aconteceram no palco do Sesc Belenzinho. A ocasião foi registrada em disco e se transformou no álbum aqui destacado, chamado de Live with David Cross. A primeira parte do álbum reflete justamente o repertório retrabalhado de Bartók. Difícil apontar destaques, já que as faixas constituem uma viagem única, no qual as clássicas e intricadas melodias do compositor húngaro são evoltas em uma massa psicodélica de sons da guitarra de Nelson Coelho e da segura base feita pela dupla Costa-Barley. O timbre da guitarra de Coelho alterna-se com grande fluência entre sons crus e processados, mostrando as habilidades de um músico completo, prolífico tanto na criação de climas com poucas e precisas notas quanto em passagens rápidas e complexas. A solidez do baixo de Gabriel Costa impressiona em Roumanian Folk Dances: Stick Games, na qual somos levados até as paisagens da Europa oriental pela guitarra rasante de Coelho.

A entrada de David Cross no álbum ocorre de forma pomposa e eletrificada com a faixa Mikrokosmos 113 : Bulgarian Rhytm I, na qual uma dobra entre guitarra e violino elétrico explode a cabeça do ouvinte ao longo de quase de 5 minutos de demonstração de alta musicalidade. A faixa seguinte, Mikrokosmos 78, entrou no repertório do show por sugestão de David Cross e é um magnífico exercício de beleza musical em sua introdução até trazer uma instigante levada de bateria e baixo em sua segunda sessão e ser transformada em um groove lancinante, transformando-se em um dos grandes destaques do álbum/show.


A sessão final do álbum homenageia o King Crimson, com poderosas releituras do repertório da banda com a presença de Cross. As faixas são cantadas pelo baterista Fred Barley, que além de excelente baterista também é um cantor de qualidade. Uma estrondosa sequência de repertório crimsoniano traz Exiles, Tonk, The Talking Drum (com outro violento duelo guitarra-violino), Larks Tongues in Aspic Pt. II e a magistral Starless. Todas tocadas em versões repletas de improvisações e ousadias, tal qual como ocorriam quando executada pelas mentes que as criaram.

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O Dialeto estará dentro da programação do CaRIOca ProgFestival 2019, no dia 10 de outubro, no Teatro Solar de Botafogo (Rua General Polidoro, 180, Botafogo, Rio de Janeiro – RJ), as 21 h, e trará toda a energia deste trabalho e demais músicas de seu incrível catálogo musical.


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